segunda-feira, 21 de maio de 2012

Sob o suor da negrura


Por Mariana Kaoos e Lucas Oliveira Dantas

Foto: Thaminy Brito
Com um nome que foi passado de geração em geração dentro da família e que remete aos primórdios da mitologia grega, Achiles Neto, quando criança, sempre participava dos desfiles cívicos referentes ao Sete de Setembro, o Dia da Independência do Brasil. Por conta da pele morena rosada e do cabelo de cuia (que possuía até então) ele sempre saia fantasiado de índio, representando assim uma parte da cultura que nos compõem e nos torna brasileiros.


Mais de dez anos se passaram e lá estava Achiles, pintado de índio no intuito de representar um pouco da inocência e da vida de sonhos de quando se é criança. A noite era do lançamento do seu primeiro disco, em parceria com Marcus Marinho, intitulado Pandora. Achiles explica que o nome foi uma escolha mais de Marquinhos, que gostava muito de uma banda de heavy metal chamada Pandora. “Essa escolha em especial acaba mostrando um pouco do que nos propomos a fazer, que é não classificar e ter que se adequar em um estilo musical. É saber perpassar por todos e transformar isso numa coisa só”, afirma. Para a surpresa da grande maioria do público, isso pôde ser confirmado logo no inicio do show, quando, após cantar uma música mais calma, Achiles e sua banda, composta por Bruno Silva no baixo, Tarcísio Santos na guitarra, Date Sena, percussão, Júnior Andrade, bateria, e Marcus Marinho no violão,  lançaram um “Chega de Saudade”, hino da bossa nova, numa versão bem rock ’n’ roll.

Foto: Thaminy Brito
Achiles é de uma geração de novos artistas conquistenses que têm movimentado a cena musical da cidade de “dentro para fora”: todos são jovens com um público específico formado, geralmente de amigos e conhecidos, mas que aos poucos evoluem em termos de audiência, conseguindo uma base de apreciação cada vez maior e mais diversa. Isso pôde ser notado na estréia de A Caixa de Pandora, onde na platéia do Centro de Cultura via-se, além de amigos e familiares, admiradores e parceiros, especialmente do meio acadêmico e da elite intelectual da cidade.

Com um ingresso a preço de custo (R$4,00 meia entrada), o público foi se acomodando aos poucos no teatro que contava com um cenário composto por baús e “bolas” em tons amadeirados e brancos. Tereza Raquel, executiva da Produções Pedrada (produtora que esteve a frente do evento) afirma que  a criação da Caixa de Pandora se deu de maneira coletiva. “Nós contamos com Luana Couto na idealização do cenário e Tadeu Cajado na colaboração. Além disso, tivemos o privilégio de trabalhar com Wandick e Paulo Cézar na iluminação. A gente já vinha criando uma linha de produções mais voltadas para o dancehall e ragga. Produzir um artista do porte de Achiles, que pra gente é completo, foi um grande desafio por tentar corresponder às expectativas dele, às do público e às nossas também.”

Foto: Thaminy Brito
Talvez por ser a estréia, o show começou de maneira desengonçada, com espaços longos dentre as canções do setlist. A abertura, realizada por Geslanei Brito, com a leitura de texto em homenagem à estrela do show, pareceu fora de lugar, apesar da beleza do que fora dito pelo legendário músico conquistense, por conta desses silêncios que marcavam a cadência do show. Em conversa com O Rebucetê, Geslanei comentou que sua relação com Achiles Neto e Marcus Marinhos se deu, inicialmente, pela surpresa em se deparar com artistas tão jovens e maduros. “Eu tomei um choque ao ouvir Agonilia, por exemplo, por identificar tanta filosofia e angústia numa letra. A procura de Achiles e Marcus de perceber as coisas, de querer transmitir arte de uma forma mais agradável, de uma maneira que alcance a todos, é louvável”, comenta.  Algumas tecnicalidades - como uma fumaça de gelo seco impiedosamente fedida e uma iluminação que pouco dialogava com a dramaticidade de algumas músicas - também incomodavam o desenvolver do show, mas duas coisas muito importantes suplantavam esses defeitos técnicos: a competente banda de Achiles e o artista em si.

Foto: Thaminy Brito
Se ele parecia nervoso no começo do show, ao longo do repertório, sua comunicação com o público ia relaxando, com falas menos longas e mais pontuais sobre o trabalho que era apresentado. Enquanto o show “A Caixa de Pandora” necessitava de uma direção de palco mais presente, o artista que o apresentava parece estar no topo do jogo. Um intéprete impecável, Achiles Neto emocionou a platéia com carisma e uma habilidade vocal de tirar o fôlego. O ponto alto do show foi a sua interpretação para “Cocoa”, que afirmou ser “uma música encomendada por Marquinhos para falar da região de onde ele veio, de Ipiaú, no sul da Bahia”. Achiles finalizou o espetáculo repetindo a música de sua autoria “João do BNH”  e a composição de Gonzaguinha imortalizada pela voz de Maria Bethânia, “O que é o que é”. O público muito comovido levantou-se e foi dançar na frente do palco.

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