2NE1 |
Em junho de 2011, um quarteto sul-coreano chamado 2NE1 lançou um single – I Am The Best – que seria o grande divisor de águas do meu gosto, apreço e até devoção pela música e cultura Pop.
Por Lucas Oliveira Dantas
A minha maior dificuldade em falar e escrever sobre o K-Pop (Korean Pop) era responder à pergunta um tanto idiota (com o perdão pela honestidade brutal): “por que gostar de K-Pop?” Não sou dos que pregam que gosto não se discute: tudo pode ser discutido, desde que se saiba de antemão que há limites.
Eu ainda não sabia explicar meu limite com o K-Pop. Porque veja bem, à primeira vista/audição, o “K” do K-Pop não passa de um preciosismo, já que musical e visualmente o Korean Pop é muito parecido/igual ao Pop ocidental, seguindo as mesmas tendências norte-americanas e europeias, ao invés de defini-las e influenciá-las, como o Pop japonês foi capaz há alguns anos.
Se as semelhanças são tantas, eu não entendia o motivo do escárnio presente na pergunta; não entendia porque o gosto pelo pop sul-coreano estava renegado à caixa dos prazeres culposos – daqueles que você admite pra poucos ou apenas pro seu analista. Porque, se gosto não se discute, quem você pensa que é para questionar meu gosto por algo?
Eu já fui um desses espíritos de porco questionadores do nada. Até que ao final do ano passado eu caí na raia maravilhosa de uma batida - muito parecida com as club-bangers/floor-filler de Britney Spears - cantada numa língua estranha, mas com um refrão tão infeccioso que se sentia universal, seja lá o que quisesse dizer, não conseguia parar de cantar: NEGATCHÊ TCHALAGÁ!
Linha de Produção
Largar de babaquice e me assumir como um fã de K-Pop demorou um tempo. De lá para cá, tento acompanhar os lançamentos em enchentes desta indústria.
A grande singularidade do K-Pop está intimamente ligada à sua forma de produção. Em suma, a indústria mainstream do Pop coreano não está à busca de talentos auto formados que, por sua vez, buscam em algum momento da carreira um contrato com a alguma gravadora para a maior distribuição de seu trabalho.
Girls' Generation |
De maneira resumida, no K-Pop há agências de talentos que estão sempre fazendo audições e contratando jovens. Estes, geralmente, são contratados ainda na infância (a partir dos 12 anos, alguns até mais novos) - tornando-se trainees - e são treinados em diversas áreas das artes performáticas: dança, canto, cênicas e até modelagem.
Os setores criativos das agências têm ideias e criam conceitos para algum grupo a ser lançado no mercado e selecionam, dentre esses trainees, os que melhores se encaixam nesses conceitos. Da audição à estréia, alguns jovens passam até mais de dez anos em treinamento. Essa é a fórmula geral para a criação de um grupo pop na indústria do K-Pop.
Mas como produtos tão manipulados conseguem ter tanto sucesso comercial e estético? As experiências ocidentais nos idos e fins dos anos 1990 não foram muito frutíferas: Spice Girls, Backstreet Boys, N’Sync e muitos outros tiveram grande sucesso comercial e cultural mundo afora, mas todos sucumbiram e desapareceram; fosse porque apenas um ou dois membros se destacavam (Justin Timberlake) ou simplesmente porque o interesse do público mudava para as divas teens (Britney, Christina Aguilera etc).
A eficiência e sucesso dos produtos do Pop coreano têm tudo a ver com a cultura rígida e disciplinada do Oriente. Se há algo que, para nós ocidentais, não precisa de muito estudo para perceber, é que orientais têm um senso de disciplina e conjunto centenas de vezes superior ao nosso.
São culturas milenares que resguardam muitas tradições e práticas, mesmo passando e acompanhando as milhares de mudanças das sociedades.
Então, os membros de um grupo coreano são apenas peças de um produto que não os pertence. Os conceitos, canções e imagens dos grupos não pertencem a seus membros e, sim, às agências; poucas são as agências que dão liberdade artística a seus grupos e poucos são estes que conseguem liberdades neste processo.
Resumindo, tudo é mercadologicamente pensado, programado e manufaturado para te conquistar e possuir.
Negatchê Tchalagá = Naega Jeil Jal Naga = I Am The Best
Óbvio que a música e até mesmo o pop coreanos não se resumem ao K-Pop - tudo na vida tem seu "alternativo". Mas, para os amantes da cultura Pop em geral, o K-Pop é um prato cheio e suculento. Especialmente por causa de seu tempero, a estética cultural sul-coreana obcecada pela perfeição.
Super Junior |
Nos MVs (video clipes) de K-Pop, grupos de quatro a nove - às vezes treze, acredite - jovens cantam e dançam em perfeita sincronia, coreografias truncadas mas que, assim como os refrões chiclete das canções, contêm elementos fáceis, altamente copiáveis.
Todos os grandes hits do K-Pop no Youtube, como I Am The Best (2NE1), Gee (Girls’ Generation), Gangnam Style (PSY) etc seguem essa fórmula em algum nível, tornando-se sucesso porque cativaram o público com coreografias fáceis e icônicas.
Essa combinação de canções grudentas e coreografias cativantes, executadas por grupos de jovens terrivelmente belos, atraentes e talentosos fazem dos grupos de K-Pop superiores a qualquer coisa parecida feita pelo ocidente.
Ao comparar um vídeo de performance dos Backstreet Boys com qualquer um de Shinee (vídeo), você tem pena, sério, dos Backstreet Boys, por mais que se reconheça sua qualidade e talento.
Como dizem os Nerds/Hipsters, K-Pop é um nível de Pop que é “só para os fortes”. Pode-se apreciar as batidas, uma e outra melodia fácil, mas daí a mergulhar no maravilhoso mundo caramelizado e esteticamente simétrico do K-Pop requer um gosto muito grande pelo gênero.
Ainda assim, como o nome do grupo 2NE1 significa por extenso “to anyone” - “para qualquer um” -, o K-Pop é produzido para ser fácil e palatável aos olhos e ouvidos de todos, sem muitas pretensões filosóficas. Compreender a beleza e extrair a filosofia disso tudo que é o grande barato.
Essa eu tenho que comentar!
ResponderExcluirAdorei o texto, mas ele me parece um início, um prólogo de muita coisa que está fervilhando em tua cabeça. Acertei? xD
O Kpop hoje em dia por aqui, de quando vc conheceu pra cá até, está muito mais fácil, mais aceitável.
As 2ne1 foram grandes responsáveis por isso, seguidas do PSY que generalizou a parada de um modo que já até enjoou.
Admitir que gostava de Kpop (ainda hoje em alguns casos) parecia admitir ser idiota. Aturar piadas, rir junto por ser minoria, e ainda assim insistir em gostar e em exibir.
Pra mim, o Kpop não envolve só a música, mas toda uma questão cultural embaralhada na indústria musical coreana que retrata muito do próprio país, o qual sou mesmo apaixonada. E concordo, encontrar a filosofia disso que é o barato.
Estou esperando ansiosamente pelos próximos textos da temática!
Manuh
exatamente manu! outros textos virão sobre o k-pop n'o rebucetê, principalmente porque, como você disse, não dá resumir o k-pop a gangnam style.
Excluire esse lance da piada consta, inclusive no grande sucesso do PSY que é merecido, mas não se pode deixar de pensar no outro lado da coisa que é o racismo ocidental, como no caso daquele bafo com o tiger jk. mas sobre isso mais pra frente - é um assunto um tanto complexo.
[lucas]