quinta-feira, 21 de junho de 2012

Diário de Bordo: Corre, que a luta é grande e a Terra não pode esperar!


Por Fran Ribeiro

Chego, desde o início da Cúpula dos Povos na Rio+20, às 9h da manhã na área da imprensa que fica ao lado do Museu de Arte Moderna (MAM), no Aterro do Flamengo. Com a Enseada da Glória ao fundo, começa a correria para montar a estrutura da TV Memória Latina, mais um projeto do Coletivo Tatuzaroio e que teve sua estréia com a cobertura especial da Cúpula. Início das atividades autogestionadas (livres), troca de experiências nos Territórios de Futuro, debates sobre o fim do uso da usinas nucleares, usinas hidroelétricas, siderúrgicas, desmistificações das ditas “energias limpas”, a revelação da farsa da energia verde, política que está sendo proposta pelos Chefes de Estado na Rio+20, pelo fim da mercantilização dos bens comuns, de corpos, mentes, da vida...calma, respira. Continua.

O ritmo das discussões e dos espaços acontece pela urgência da transformação, dos povos tomarem a frente de um processo que está vendido às grandes corporações, em razão do lucro. Tudo é privatizável. A lógica da economia verde é essa. E os debates e articulações feitas na Cúpula querem novos paradigmas de sociedade que sejam de bem comum do coletivo global, e não em favor do sistema. Todos os dias, mais de 15 mil participantes transitam entre as 36 tendas, cinco plenárias e exposições espalhadas nos 7 km do Aterro do Flamengo, além dos moradores do Rio, que também se fazem presentes na Conferência que reúne uma pluralidade de movimentos.

Retoma o fôlego, que vem mais!

No sábado (17) e no domingo (18), na Escola de Comunicação da UFRJ, o II Fórum de Mídia Livre (FMML) que reuniu militantes pela democratização da comunicação e da cultura de dez países, discutiram o papel da comunicação alternativa como tática necessária para a emancipação humana, a defesa da comunicação e a cultura como bens comuns, que também estão no rol de “produtos” mercantilizados. E no domingo, os movimentos sentiram como o aparelho repressor do Estado pode ser “bizarro” (única palavra que me vem à mente quando penso no episódio). Funcionários da ANATEL (Agência Nacional das Telecomunicações) chegaram ao Aterro para fechar a Rádio Cúpula, que através da articulação de movimentos como a Amarc (Associação Mundial de Rádios Comunitárias), EBC (Empresa Brasil de Comunicação) e outras 50 outras rádios públicas e comunitáriasda América Latina, conseguiram o espaço na 90,7 Mhz para divulgar todos os debates que estavam sendo feitos durante a Conferência, em sua maioria, denúncias e críticas ao sistema vigente.

O abuso de poder e a truculência por parte da Polícia Militar e da Polícia Federal mobilizaram rapidamente diversos coletivos, entidades de mídia livre e comunicadores populares para proteger a Rádio dos Povos. Após horas de negociação que envolveu organizadores da Rádio, integrantes do Coletivo Intervozes, EBC e a AMARC com a Anatel e o Ministério das Comunicações, uma “licença experimental” foi autorizada e Rádio garantiu sua transmissão até o dia 23, através da 98, 7 MHz. Ainda no dia 17, começaram as Plenárias de Convergência, nos cinco eixos da Cúpula: 1 – Direitos por Justiça Social e Ambiental; 2 – Defesa dos Bens Comuns Contra a Mercantilização; 3 – Soberania Alimentar; 4 – Energia e Indústrias Extrativistas; e 5 – Trabalho: por uma outra Economia e Novos Paradigmas para a Sociedade.
Na segunda-feira (18), as mulheres tomaram conta da Cúpula. Organizadas em um grande ato, mais de 10 mil estudantes, sindicalistas, negras, latino-americanas, brasileiras e camponesas do mundo se juntaram no primeiro grande ato. Do Aterro, a bateria da Marcha Mundial das Mulheres repassava a energia dos batuques aos manifestantes, que caminharam até a Cinelândia até se concentrarem em frente ao Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES). Intitulado “Marcha a Ré da Rio+20”, as pessoas caminharam em alguns momentos para trás, contra o retrocesso socioambiental e o atual modelo de desenvolvimento que está sendo decidido pelas autoridades durante a Conferência da ONU.

Acorda, que já são 7h da manhã!

Na terça-feira (19), uma das atividades livres mais lotadas que eu pude presenciar. O debate sobre os Novos Paradigmas da Civilização reuniu dois dos principais teóricos da atualidade: Leonardo Boff e Boaventura Sousa Santos. Em falas que fizeram, os olhos de várias cores e nacionalidades brilharem ainda mais na certeza de que só com luta coletiva é possível enfrentar o que nos está imposto. Boff e Sousa tocaram em um dos pontos essenciais que a Cúpula dos Povos pode potencialmente gerar sementes de transformação: o resgate dos valores e princípios humanos. No final do dia, quase duas mil pessoas voltaram ao Centro, e em frente ao escritório da Vale do Rio Doce e protestaram contra as corporações. Na 1ª Assembléia dos Povos, foram apresentados os documentos redigidos nos dois dias de Plenárias de Convergência, os quais apresentaram a visão coletiva das falhas do sistema, que levou ao mundo a crise atual.

No sexto dia, a Mobilização Global. Na quarta-feira (20), dois grandes atos fervilhou a cidade carioca. Pela manhã, mais de 3 mil pessoas foram até a Vila Autódromo, em um ato em solidariedade aos moradores da comunidade, que estão sendo ameaçados pela especulação do sistema, em uma cidade vendida às grandes corporações. Ao se aproximarem do local onde estavam reunidos os Chefes de Estado, o Riocentro estava blindado por forças militares. À tarde, cerca de 80 mil pessoas, marcharam no Centro contra a mercantilização da vida e em defesa dos bens comuns. Da Avenida Rio Branco até a Presidente Vargas, os carros foram substituídos por pessoas, que mostraram que só com mobilização e articulação do movimento, poderá ter transformação. Recupere as energias, que a luta continua.

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