Em sua passagem por Vitória da Conquista, no Festival Suíça Bahiana 2012, o grupo de Rap Cone Crew Diretoria foi o pesadelo que toda produção local gostaria de evitar, mas me proporcionaram a pauta do sonho de qualquer jornalista cultural iniciante.
Por Lucas Oliveira Dantas
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Apresentação fria e irresponsável do grupo Cone Crew Diretoria/ Foto: Coletivo Suíça Bahiana |
Em espasmos barulhentos, Batoré da
Cone Crew Diretoria, pegou o jovem repórter do site local, o agarrou à força fingindo um beijo; tentando manter os ânimos com sarcasmo, o garoto exigiu respeito. Você precisa de autorização para tocar nessa boca aqui, meu querido. E, conseguindo a reação que esperava para sua performance
offstage, Batoré continuou a piada, pegou o garoto – que naquele instante se lembrou que estava sendo filmado desde o princípio –, levantou sua blusa exibindo-o para a câmera, enquanto parte das pessoas riam da performance
Jackass e outras observavam chocadas. O repórter abaixou a própria blusa e, percebendo que o showzinho ia além da empolgação inconsequente e vendo que não conseguiria a entrevista pela qual estava ali, saiu esbravejando contra a banda, equipe, câmeras e sabe-se mais lá o quê.
Show frio
Antes e após um show controverso – em que as falhas de comunicação (para dizer o mínimo) aconteceram entre banda e plateia, produções e, no meio de tudo, a MTV – a banda não só causou um verdadeiro rebucetê nos bastidores do festival, como com o próprio O Rebucetê.
Frio e, na maior parte, unilateral, o show discorreu de forma totalmente oposta aos shows anteriores. A interação com o público era esparsa, com Cone Crew se direcionando na usual marra prepotente dos rappers, mas com o carisma de uma ervilha crua que faria Eminem (que não é conhecido por sua simpatia) sentar e chorar. Ou bocejar.
Com rimas/piadas homofóbicas e um arriscado discurso autoindulgente, a banda chegou a ser vaiada em alguns momentos e, mesmo mantendo alguns fãs e admiradores de rap acompanhando até o fim, maior parte da plateia esvaziou a Arena Miraflores poucos minutos de iniciado o show.
Acontece que o show mesmo estava acontecendo nos bastidores e a partir daqui o relato toma um cunho mais pessoal.
Enquanto editor da cobertura d’O Rebucetê, eu ficava alternando entre a sala de imprensa, monitorando as postagens; a pista, auxiliando os repórteres e fotógrafos, e o backstage pré-produzindo as futuras entrevistas e tirando eventuais instagrams do palco.
Mas, se o acesso para a imprensa local vinha sendo livre até então, com Cone Crew Diretoria, segundo o produtor deles, “aqui só MTV”. Eu achei graça, pois já consegui minhas fotos e de quebra um furo! Sim, um furinho de meia tigela, mas pense o quanto poderíamos reclamar no Twitter!
kekeke...
Aliás, reclamar era o consenso geral da produção do Festival quando se mencionava Cone Crew. Logo quando chegamos, antes de tudo começar, uma das produtoras nos disse que os caras estavam para ser expulsos do hotel devido a baderna. Óbvio que adorei saber disso! Os burburinhos, inclusive, davam conta de que eles emporcalharam o camarim, tendo até mijado em cima da mesa.
Mas, depois de ser limado a favor da MTV, desci até os camarins para afinar a entrevista de mais tarde e, ao encontrar as colegas Luiza Audaz e Maria Eduarda, contava sobre a exclusividade
mtvística, quando me aparece o produtor executivo do grupo.
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"Coração involuntário"
obra de Cone Crew Diretoria* |
Colei nele para saber da nossa pauta e, de repente, estava no camarim com ele. Sim, os rumores eram fatos, mesmo que até agora ninguém tenha comprovado que o coração involuntário (foto) em cima da mesa era mesmo feito de mijo. E mesmo após o produtor desdenhar da minha cara – “tamo fugindo de imprensa” – continuei rindo à toa sem saber porque… mentira, sabia sim: tinha conseguido comprovar o furo do camarim.
Só que o negócio começou a pegar fogo quando Luiza – que faria as vezes de repórter naquela noite –, tentando salvar a pauta planejada, iniciou um sobe-desce de escadas em conversas acaloradíssimas (sim, isso é um eufemismo) com o tal produtor.
E então, conforme o chacoalhar da vodca começava a revelar os monstros de todos, uma verdadeira confusão se instalou entre Cone Crew Diretoria e O Rebucetê, indignado com a postura pedante da banda e equipe (on e off stage).
Consegui salvar a pauta, mas minha repórter estava puta da vida, subiu nas tamancas dizendo que não ia fazer mais entrevista nenhuma! E eu parti de argumentos sensatos:
“Cara, você que estudou a porra da pauta!”
…Para a pose de chefia:
“A entrevista vai acontecer e pronto! E é você quem vai fazer!”
Até ao ponto que eu mesmo anotei as perguntas elaboradas por Luiza e parti para os bastidores em busca de cumprir a pauta.
Estava pouco me fodendo para o pernosticismo da banda e equipe. Ao passo que eu queria realmente concluir a parada, meu espírito jornalístico se arrepiava apenas com a áurea eletrizante da situação. Aquilo ia dar em muita coisa e é óbvio que eu queria ver tudo!
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Instalação: TRASH-EZA
obra de Cone Crew Diretoria* |
O comportamento do Cone Crew Diretoria e equipe no camarim foi TE-NE-BRO-SO! Sob o mais estúpido estereótipo de
rock stars, eles faziam algazarra, sujavam coisas, jogavam gelo e comida uns nos outros, tiravam a roupa. Tudo isso deliberadamente para as câmeras da MTV, claro.
Enquanto os Bernadino e Purki, fotógrafo responsável pela pauta, olhavam tudo com desconfiança e seriedade, eu continuava rindo de tudo. Era bom demais pra ser verdade! Meu estágio pessoal de
Rolling Stone, acompanhando um momento da turnê de uma banda que despontava no cenário nacional. Não vou mentir que, só de pensar naquelas câmeras da MTV fico arrepiado… um misto ridículo de vergonha e fogo no rabo.
Luiza discutia com os produtores, que começavam a mudar o discurso de "nada de entrevistas" para "entrevista só no hotel". Vocês só vão sentir o que é Cone Crew de verdade se forem com a gente pro hotel. Porra nenhuma, eles queriam mesmo era sentir Luiza, mas eu não me oporia se ela e Purki quisessem ir.
Olhando atentamente para as caras de todos, me perguntava o quanto e desde quando aqueles caras estavam enchendo a cara. De álcool e seja mais lá o que você quiser imaginar. Era óbvio para mim, naquele momento, que a pauta não daria em entrevista alguma, mas era necessário estar ali! Propósitos jornalísticos, um sentimento que (entendi naquele momento) era muito complicado de explicar.
Quando Batoré subiu minha camiseta, fiquei excitado! Mas não porque aquele energúmeno, pseudo músico, celebridade de MTV me ridicularizava em frente à câmera, mas exatamente porque eu só pensava na pauta! E não existia nada melhor para mim do que a forma com a qual Cone Crew tratava a mim e a’O Rebucetê… e Conquista!
Enquanto meus amigos e colegas se chocavam, eu juro: só não me sentia como Nicole Kidman em “Um Sonho sem Limites” por que cometi a burrice de não ligar a câmera desde o princípio.
O ponto alto foi quando, Rany Money, um dos membros mais tranquilos daquela trupe de gente mal educada, virou para mim e disse:
“mas você tem que entender como é que você aborda o cara. Você tem jeito de homem, mas se você se comporta como mulher, os caras vão te tratar como mulher!”
Quer dizer,
tirar minha roupa sem meu consentimento para a câmera! Quem precisa de entrevista?!
*Fotos por Lucas Oliveira Dantas. Sim, as legendas são ironias.