domingo, 14 de outubro de 2012

Aquilo Que Meu Olhar Guardou Pra Você



Por Luiza Audaz

O mês das pessoas vindas do ar começou num tom de outubro tão leve e tão instigante, assim como a performance dos rapazes simpaticissímos do grupo Magiluth de teatro, de Pernambuco, atuando em “Aquilo Que Meu Olhar Guardou Pra Você” no Festival Internacional de Artes Cênicas em Salvador.


Os encontros e o comportamento do homem contemporâneo como tema bastaram para que a plateia se tornasse parte da trama e, aos poucos, fosse sendo imersa no processo. Os atores, todos homens, representavam  diversas situações cotidianas e acima de tudo a relação que desenvolvem sentimentalmente  entre si, sendo pais, maridos, filhos, irmãos ou amigos.

O palco era livre e sem cenário, apenas um radinho num canto e umas cervejas espalhadas. A cada momento uma situação nova se criava e a notícia do “ser humano”, que vinha de fora, que vinha da vida, ia se contorcendo nos textos, nas explosões e nos questionamentos.

Um jogo de verdade e mentira era encenado numa festa entre amigos, muitas cervejas, divagações e dúvidas iam revelando um mundo de subjetividades que exalamos em nossas relações, que constroem nossas máscaras. O encontro de um casal em crise, num jantar talvez, eclodia numa briga e a proposta mais fora da órbita do mundo masculino, para muitos, erguia-se num convite:

“Dança comigo? Por favor, dança comigo?”

A valsa entre aqueles dois gigantes - tão frágeis naquele momento - iniciou-se como entrega. No mesmo ato, a dança singela se converteu em socos  e... bingo! Estava lá a eterna contradição do homem e seus sentimentos.

As luzes se apagaram, um homem aparece no centro do palco, apenas uma luz direcional o revela. Uma pequena projeção apareceu sobre seu corpo e o texto veio como chuva e lágrimas. Nu ele jorrou um dos textos mais simples e tocantes da peça.

“Eu não tenho olhos, eu não tenho nariz, eu não tenho boca, aqui, eu não tenho pés, eu não tenho, eu não tenho verbo, eu não tenho ação, eu não tenho depressão, eu sou amorfo (...) você procura o que tem em mim, o que tem em mim você procura por ai (..)“

A seguir, o final é marcado com experiência sonora atrás de nossas cabeças, - vindo do lugar de onde menos se espera representação alguma - na parte alta da sala do coro, oposta ao palco, a voz reproduzida através de um megafone arrematou de maneira emocionante aquele espetáculo em forma de fábula. Os espectadores paralisados procuravam o que ver diante seus olhos, mas aquele texto belíssimo rebatia pelo breu do teatro e espancava sem dó.

Os aplausos ao fim foram presenteados pela luz de pequenos isqueiros que piscavam na escuridão do palco, eles ainda estavam lá, na penumbra, como estrelas do teatro, irradiando aquele 3 de outubro com uma apresentação linda, e nos presenteando como quem diz: “ Aquilo que meu olhar guardou pra você”.

Não era o fim, o último ato aconteceu através de um convite a todos os espectadores a subirem no palco para compartilhar experiências e aquelas tantas cervejas que precisavam ser degustadas. O encontro não seria mais apropriado, pouco a pouco fomos levantando de nossas cadeiras e subindo no tablado, ali mesmo, no palco de se encenar, de se revelar, se criar, se esconder, de se mentir, de se reinventar.

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