segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Too Late! (antigone) contest #2

Por Ayume Oliveira


Talvez não tão tarde... a peça italiana encena as esferas do poder, tanto no âmbito da macropolítica quanto no familiar, e mescla elementos contemporâneos à tragédia grega Antígona, com citações de Bertold Brecht e exaltação de movimentos sociais como “Occupy Wall Street”.

A peça começa com o diálogo entre pai e filho (personagem encenado por uma mulher com características andrógenas que ao decorrer do espetáculo se desfaz do bigode falso e da peruca). O diálogo no primeiro Ato é bestializado e o adolescente se transforma em um cachorro voraz. Entre latidos a relação de poder entre pai e filho se destrincha. O cão grane e o pai assobia 'fiu-fiu-fiu... calminha... aqui tá o seu osso', que soa como 'você depende de mim, e sabe disso'.

A peça utiliza de recursos do teatro contemporâneo, como a metalinguagem, onde os atores muitas vezes paralizam a cena para discorrer sobre a encenação: “como ficaria melhor?”; “tenho dificuldade no latido, puxa aqui... no diafragma” ou “se Creonte morresse de bala perdida causaria mais impacto no nosso público ou seria melhor um ataque fulminante?”

A tragédia grega, escrita há 2500 anos por Sófoles, expõe a problemática da opressão de um Estado e a condição da jovem Antígona, sobrinha de Creonte, que o enfrenta. Os dois atores, Silvia Calderoni e Vladimir Aleksiv revezam os personagens de Antígona ou o filho adolescente e Creonte ou o pai opressor. Creonte (imagem do poder) utiliza uma máscara de látex, ou melhor duas. E é surpreendido por Antígona/atriz: “Vlad, por que duas?”, ao que ele responde: “Ah, improvisos do teatro”. 

Num outro diálogo travado entre a mesa de refeições da família e a estrutura de iluminação do palco, a adolescente se utiliza de hidrocor para escrever no corpo semi-nu dependurado: atriz, poder, anarquismo, opressão. Simultaneamente, a menina retira o Iphone de uma das meias e começa a ouvir o hit 'Mr. lonely' enquanto o pai dispara initerruptamente com cinismo: “Vai limpar esse corpo, corta esse cabelo, para de se pendurar você é uma moça, desliga essa música, aprenda a se portar à mesa, você está parecendo um menino.” VAI, FAÇA, PÁRA, SEJA. “Eu lhe dou as ordens,você escuta.”

Na tragédia grega Antígona é condenada à morte, como penalidade e castigo pela sua desobediência e se pergunta: “(…) cercada de infortúnios como vivo, a morte seria então uma vantagem?”. Ao contrário, no espetáculo da companhia Motus, o fim trágico é destinado a Creonte, que despenca das escadarias do teatro, enquanto 'lonely, i'm Mr lonely, I have nobody' ainda ressoa. Morre de bala perdida enquanto sapateia para a plateia, ressucita e morre novamente de taquicadia. Antígona/atriz assiste. Retira uma das máscaras do 'defunto', a preenche com papel de modo que não seja mais flácida até que se torne um rosto.

Ao fim da peça morre Creonte. O tirano na companhia de si mesmo, abandonado com suas duas cabeças.


Ficha Técnica: 
Concepção e direção: Enrico Casagrande e Daniela Nicolò
Elenco: Silvia Calderoni e Vladimir Aleksic
Trilha sonora: Enrico Casagrande
Produção: Motus
Língua: italiano (com legenda)

0 comentários:

Postar um comentário